Em reunião com deputados relatores do projeto do novo CPC (PL 8046/10),
20 dos 33 ministros do STJ indicaram os pontos que consideram críticos
do texto em tramitação na Câmara dos Deputados. Um dos principais
alertas foi em relação à expectativa de que o novo CPC venha a ser um
instrumento de agilização processual, que não seria realista.
“Não acredito
que a simples mudança na lei processual possa representar uma mudança
significativa em termos de duração do processo. O que precisa ocorrer é
uma redução no número de litígios, criar mecanismos judiciais que tornem
desnecessário repetir tantas vezes o mesmo julgamento. Isso sim reduz o
tempo da prestação jurisdicional e inibe a judicialização demasiada que
ocorre hoje”, alertou o ministro Teori Zavascki.
Zavascki também
apontou que a oportunidade de elaborar um código legal é rara, já que
essas normas são feitas para durar e dar novos caminhos para o futuro.
Segundo o ministro, o texto, até o momento, preocupa-se mais em
consolidar do que em renovar o sistema.
“O projeto
atende em parte a essa necessidade de redução dos litígios, mas nós
podemos avançar mais. Tivemos hoje aqui várias ideias nesse sentido, de
prestar mais autoridade às decisões já tomadas e inibir o aparecimento
de novas ações”, avaliou. “Não dá para pensar em processo atualmente sem considerar as ações coletivas”, concluiu.
Ações coletivas
A preocupação com
os processos de massa também foi tratada pelo ministro Sidnei Beneti.
Ele apontou que uma questão sobre planos econômicos soma milhares de
ações individuais e centenas de coletivas. Para o ministro, é preciso
avançar para procedimentos que inibam o ingresso de outras ações
individuais ou coletivas sobre os mesmos temas e que formem teses em
tribunais superiores de forma rápida, definitiva e por salto.
Segundo Beneti, é
necessário “desjudicializar” processos como execução e vincular de forma
capilar a administração pública às decisões jurisprudenciais, de modo a
evitar, também, a dispersão jurisprudencial. Para ele, ao evitar
abordar as ações repetitivas, o texto do CPC corre o risco de não dar
celeridade aos procedimentos nem limpar a massa de lides “a varejo”.
Garantismo fiscal
O ministro Cesar
Asfor Rocha ressaltou sua preocupação com o excesso de poder do Estado
contra o contribuinte. Para o decano do STJ, nem tudo que o Estado
postula traduz interesse público, e há distorções claras no sistema.
Ele, que considera
as regras constitucionais uma conquista da civilização, sustentou que a
Fazenda Pública, hoje, não precisa de benefícios de prazo, por exemplo.
Em sua avaliação, o Estado já é poderoso, e quem precisa de proteção é a
pessoa.
Paridade de armas
Preocupação similar
esteve presente nas observações do ministro Herman Benjamin. “A
proteção dos sujeitos vulneráveis define o estado social”, afirmou. “Portanto,
o novo CPC, ao contrário do vigente, não pode tratar as partes como se
fossem iguais. É fundamental que isso esteja reproduzido no ônus da
prova e na paridade de armas”, completou.
“Via de regra, o
processo só é benéfico para quem tem recursos financeiros, bons
advogados, uma banca de advocacia à sua disposição 24 horas por dia,
todos os dias do ano. É fundamental essa mudança de perspectiva, no
sentido de assegurar a paridade de armas”, afirmou.
“É uma
aberração da liberdade processual a juntada de cinco pareceres, dos
melhores especialistas do país, em um processo em que a outra parte
sequer tem um advogado para fazer sustentação oral. Ou que memoriais
sejam apresentados no último momento, sem conhecimento da parte
contrária, e esses memoriais e pareceres sejam citados nas sustentações
orais e nos votos dos relatores”, criticou Benjamin.
“Isso
desestrutura a paridade e o próprio sentido de justiça da
processualística, que deve gerir a prestação jurisdicional”, asseverou.
“O texto do NCPC está passando por um debate amplo e essa questão da
paridade de armas e proteção aos vulneráveis está muito clara no
encaminhamento dado pela comissão”, concluiu o ministro.
Litígio e conciliação
O relator geral da
Comissão Especial da Câmara para o CPC, deputado Sérgio Barradas
Carneiro, apresentou, ao lado do relator substituto, deputado Paulo
Teixeira, os principais pontos alterados pelos deputados em relação à
proposta aprovada no Senado Federal.
O deputado Teixeira
afirmou que o novo NCPC precisa se adequar a uma sociedade
contemporânea e complexa, em que mais de 40 milhões de pessoas
ascenderam socialmente, fenômeno que deve pressionar ainda mais a
demanda judicial. Ele apontou como alterações necessárias, mas ainda não
contempladas, a remuneração dos advogados pelas conciliações e não só
pelos litígios. Para Teixeira, o Judiciário é responsabilizado por
falhas que não são dele.
“Eu esperava
uma posição mais defensiva da Corte, mas encontramos uma exigência forte
por instrumentos modernos para o Judiciário. Saio muito realizado
daqui. Espero que consigamos convencer a todos da adoção desses
mecanismos no CPC”, afirmou Teixeira.
Destaques
Entre os destaques
eleitos por Carneiro, estão a criação de um incidente para resolução de
lides repetitivas, em que um único processo representativo da questão é
submetido às instâncias superiores para fixação de tese, o prestígio de
meios eletrônicos – inclusive videoconferências em ações civis –,
limitação ao número de testemunhas e aumento da multa para recursos
protelatórios.
O texto também fixa
o caráter alimentício dos honorários, regulamenta a força normativa da
jurisprudência, o amicus curiae e as astreintes (multa para forçar o
cumprimento de decisão), e faz com que a sentença gere um título
passível de protesto. Outras mudanças são a abordagem do ônus da prova,
que passa a não ser confundido com encargos financeiros de produção de
prova, e a instituição do regime inicial semiaberto para a prisão civil
do devedor de alimentos.
Segundo o relator
geral, o trâmite do novo CPC na comissão especial deve se encerrar em 18
de setembro, com a aprovação dos destaques. Depois, a matéria segue ao
plenário da Câmara, antes de ser devolvido ao Senado em razão das
diversas alterações que o texto deve sofrer.
A ministra Nancy
Andrighi celebrou a iniciativa dos deputados. Ela afirmou que, apesar de
atuar diariamente com processos há mais de 30 anos, é a primeira vez
que soube da presença de parlamentares no STJ para ouvir os seus membros
em um debate aberto.
Participaram da
reunião o presidente do STJ, ministro Ari Pargendler, e os ministros
Cesar Asfor Rocha, Castro Meira, Teori Zavascki, Nancy Andrighi, Massami
Uyeda, Herman Benjamin, Humberto Martins, Sidnei Beneti, Napoleão Nunes
Maia Filho, Og Fernandes, Raul Araújo, Mauro Campbell, Isabel Gallotti,
Villas Bôas Cueva, Antonio Carlos Ferreira, Sebastião Reis Júnior,
Paulo de Tarso Sanseverino e Marco Buzzi, além do desembargador
convocado Adilson Macabu e dos professores Paulo Lucon (USP) e Daniel
Mitidiero (UFRGS).
FONTE: Migalhas
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